terça-feira, 30 de junho de 2015

IMIGRAÇÃO DE SENEGALESES MOTIVA PESQUISAS NA ÁREA  - RS

Com o objetivo de mostrar aos caxienses o que não está claro com relação a migração e a cultura dos senegaleses, um grupo de seis pesquisadores realiza, desde o ano passado, um trabalho a respeito desta migração. Entre os pesquisadores está a professora da UCS e doutora em história Vânia Herédia, além de pessoas da Universidade Federal de Santa Maria, da Universidade de Passo Fundo e do Centro de Atendimento ao Migrante (CAM). Cada um pesquisa a migração em sua região, já que o trabalho abrange todo o estado do Rio Grande do Sul. Vânia comenta que a UCS possui um grupo que trabalha as migrações desde 1998. “Caxias sempre absorveu muita mão de obra”, afirma a pesquisadora. Em 2011 eles começaram a observar o movimento de haitianos em direção ao sul do Brasil. Em 2014 iniciaram o grupo de estudos sobre os senegaleses, que é financiado pela Fapergs.
senegaleses 1
Islamismo é a principal religião entre os senegaleses
Segundo Vânia, neste período de pesquisa, foi possível perceber um profundo desconhecimento, por parte dos caxienses, sobre a cultura afro e a relação entre ela e a cultura brasileira. O trabalho de pesquisa inclui participar das diversas reuniões e celebrações religiosas dos senegaleses. Também foram entrevistados mais de 50 imigrantes. Algumas características da migração já foram trazidas à tona. Segundo Vânia, a migração dos senegaleses é laboral, ou seja, eles vêm em busca de trabalho. Normalmente, eles não têm alternativa ou oportunidades em seus países de origem e aceitam trabalhos que não são procurados pelos caxienses, ou seja, vagas remanescentes. Outra característica da migração é que ela é predominantemente masculina e de jovens. Mesmo com a crise econômica,
Vânia acredita que ainda há vagas para os imigrantes, pois o corte de vagas é principalmente na área industrial e não tanto no setor de serviços. O trabalho será concluído no final deste ano e um seminários para divulgar as descobertas feitas, aberto ao público, está programado para o dia 10 de dezembro. Também será lançado um livro sobre o assunto, o volume dois da série intitulada Mobilidade Humana e Dinâmicas Migratórias.
“Quanto mais conheço a realidade dos imigrantes, mais percebo o quanto é interessante a diversidade cultural”
A curiosidade por novas culturas também estimulou a estudante Juliana Rossa a realizar seus trabalho de doutorado sobre os novos imigrantes na região de Caxias. “Conviver com o diferente faz com que possamos refletir sobre nós mesmos, nos torna mais abertos e compreensivos”, explica. Para ela, a falta de conhecimento e a repetição de afirmações de senso comum são as principais causas da intolerância com os imigrantes. “Há cerca de dois anos venho fazendo um acompanhamento etnográfico com os imigrantes senegaleses em Caxias do Sul. Procuro participar de diferentes eventos realizados por eles”, relata.
Juliana também destaca algumas conclusões. A maioria dos senegaleses, segundo ela, pratica uma vertente do islamismo e frequenta uma mesquita no centro de Caxias. Eles possuem dois idiomas principais, o francês e o wolof, além de entenderem um pouco de árabe. Outra característica observada é que, como no Senegal a expectativa de vida é menor, eles se aposentam com cerca de 50 anos e os filhos tem o papel de sustentar os pais. Quando não encontram emprego em seu lugar de origem, migram para outros lugares.
Conforme a doutoranda, Caxias do Sul acolhe hoje cerca de 3 mil senegaleses. “Eles vêm pra cá por uma junção de motivos: o auxílio do Centro de Atendimento ao Migrante (CAM), da Igreja católica, do apoio de entidades como Câmara de Vereadores, do Ministério do Trabalho e Polícia Federal. Diversas reuniões foram feitas entre esses envolvidos, para tentar agilizar processos, documentos”, explica. A previsão de Juliana é que a tese seja finalizada em dois anos. “Para mim, é uma espécie de dialética: quanto mais conheço a realidade dos imigrantes, mais percebo o quanto é interessante a diversidade cultural. Mas na essência, compreendo que somos todos iguais enquanto seres humanos, pois todos buscamos uma vida digna e melhores condições”, conclui.
Confira no infográfico algumas características destacadas pelas pesquisadoras.
Texto: Alana Bof
Foto: Juliana Rossa
Senegal 2
Fonte: http://novosimigrantesemcaxias.com/2015/06/26/imigracao-de-senegaleses-motiva-pesquisas-na-area/

segunda-feira, 29 de junho de 2015

Um pedaço do Senegal no Rio Grande – 

Atualmente, cerca de 200 senegaleses vivem na cidade do Rio Grande

Um pedaço do Senegal no Rio Grande – 1ª Parte
Senegaleses muçulmanos durante culto na Mesquita
Chegando pelo céu – bem diferente do que acontece com os africanos, que se abarrotam em barcos e arriscam a vida nas águas do Mar Mediterrâneo, numa tentativa de sobreviver na Europa – milhares de senegaleses hoje vivem no Brasil. Divergindo de outros países em que existem conflitos étnico-religiosos, que, muitas vezes, obrigam o nativo a deixar o país, no Senegal, atualmente, não há conflitos. Mas a motivação em deixar o país e os que amam para trás é a mesma nos dois casos; os africanos não procuram riqueza ou primam pelo conforto, eles arriscam tudo em busca de uma vida digna, para si e para os que amam.
Sem se preocuparem com o próprio conforto, deixando para trás pais, filhos e esposa, cerca de 200 senegaleses residem hoje em Rio Grande. Grande parte mora em alojamentos pelos bairros da cidade, alguns trabalham com carteira assinada e outros vendem artigos pessoais nas ruas do Centro da cidade. Todavia, nenhum quer ficar parado, porque o objetivo de todos, sem exceção, é apenas um: trabalhar bastante para poder enviar dinheiro para suas famílias, que ficaram lá no Senegal.
A partir dos depoimentos, percebe-se que os quase 7 mil quilômetros que separam a cidade do Rio Grande de Dakar – capital do Senegal – não conseguem separar os laços afetivos entre as pessoas, tampouco diminuir sentimentos e o senso de responsabilidade e cuidado para com o outro, que os senegaleses cultivam mesmo distantes. Acompanhe, nesta série, o dia a dia dessas pessoas que assumiram o risco do desconhecido em busca de emprego e dignidade, munidos, muitas vezes, apenas de esperança, uma boa educação e um belo sorriso.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) destaca, atualmente, os senegaleses como o principal grupo de solicitantes de refúgio. Segundo dados do ACNUR, 2.164 solicitações de refúgio, por parte de senegaleses, estão em trâmite no Comitê Nacional dos Refugiados (Conare).
Mas, por que será que os senegaleses querem tanto sair de seu país? Com base no que vem acontecendo na Europa, as apostas eram todas baseadas em supostas fugas: guerras, conflitos étnicos e miséria. Estas possíveis respostas eram muito atrativas aos olhos da imprensa.
Porém, com o passar do tempo e com o contato com essas pessoas, percebe-se que a questão mais interessante a ser abordada não era simplesmente o que os fez sair de lá, mas, sim, o que os faz ficar aqui e, também, o que os faz sonhar em um dia voltar para o Senegal. Todas estas questões têm a mesma resposta: família.

A chegada e as primeiras impressões 
Quando foi entrevistado Mamadoudeme, o risonho estrangeiro havia chegado em Rio Grande há apenas uma semana. Cheio de esperança, Mama veio de avião do Senegal, desceu no Acre e seguiu até aqui de ônibus. Contou que, até aqui, fez duas paradas, uma em São Paulo e a outra em Passo Fundo, devido às duas cidades possuírem grandes associações senegalesas, que recebem os imigrantes e os auxiliam com suas eventuais necessidades.
Sua decisão em deixar a terra natal foi impulsionada pelo objetivo que move também a maioria de seus compatriotas: juntar dinheiro. Apesar do pouco tempo no País, Mama disse – com a tradução do amigo Dame, outro senegalês que o leitor conhecerá na próxima edição – estar gostando do lugar e das pessoas. Contou-nos, também, a respeito da tática que estava usando, durante a primeira semana, para tentar evitar um estranhamento muito grande. “Eu estou no Brasil, mas estou achando que ainda estou no Senegal, faço isso pra não ficar triste. Fico sempre pensando que estou no meu país”, revela.
Em seu país, Mama, deixou os pais, os irmãos, a esposa e os seis filhos. Lá, ele trabalhava em barcos de pesca, em alto mar, e é neste ramo que pretende conseguir trabalho também aqui. E, para isso, Mama já está preparado. Em apenas uma semana no País, já está munido de sua carteira de trabalho e indo em busca de uma ocupação. Talvez, ao conseguir realizar o que aqui veio fazer, Mama possa enfrentar a mudança e aceitar o lugar onde está.
Sobre as diferenças entre os dois lugares, Mama acredita que a mais marcante seja o religião. “Lá somos a maioria muçulmanos, aqui são cristãos, a vida é diferente e a maneira de viver também, mas eu estou me sentindo bem aqui”, disse, sempre sorrindo, completando que pretende ficar no Brasil durante três ou quatro anos.
Um fotógrafo limpando peixe
Esta é a realidade do senegalês Abdou Lahat, 35 anos, que está em Rio Grande há quase 3 anos. Visando a maiores ganhos e, também, à possibilidade de uma vida mais digna para a família, que ficou no Senegal, o homem deixou a cidade de Louga – a 200 km da capital Dakar – e, logo que chegou aqui, conseguiu trabalho em uma indústria de peixe e, de lá, não mais saiu.
A reportagem encontrou Abdou com a ajuda da coordenadora da Pastoral do Migrante, irmã Ariete D’Agostini. Apesar da grande maioria dos imigrantes senegaleses serem muçulmanos, eles são assistidos pela Pastoral. O alojamento onde vivem Abdou e outros seis senegaleses é uma casa grande, no Centro da cidade, mas em uma zona um pouco perigosa. Peças amplas, largos corredores, paredes úmidas e poucos móveis fazem parte da decoração do local.
Era uma quarta-feira à noite, um deles preparava o jantar. “Sim, ele está preparando o jantar, será peixe e arroz. Cada dia é um que cozinha, meu dia é sexta”, disse o africano ao se referir ao cozinheiro do dia, outro senegalês que preparava o jantar, cantando trechos de funks brasileiros.
No começo, Abdou se mantinha econômico com as palavras, limitava-se a responder com poucas sílabas as perguntas que eram feitas a ele, mas, pouco a pouco, foi sentindo-se confortável e acabou contando como é sua vida aqui e como era a sua vida no Senegal.
  
A cidade e a vida em Louga
A língua falada em Louga é o Wolof – lingua-mãe de 40% da população do Senegal – e a cidade conta com pouco mais de 82 mil habitantes, tendo na agricultura sua principal atividade. Lá, Abdou trabalhava como fotógrafo no estúdio da família, fazia a cobertura de festas de casamento e aniversário, editava fotos e criava vídeos para os clientes.
Em Louga, ficou a esposa Nara – com quem fala, todos os dias, por facebook e viber – e, também, o pai, a mãe e os cinco irmãos. Sobre sua cidade, Abdou foi objetivo e respondeu outras questões: “Louga não tem mar, é uma cidade pequena, que tem muita agricultura, eu sinto saudades de lá […] eu tinha um emprego que eu gostava muito, mas, aqui, o salário é melhor, aqui é mais fácil de conseguir trabalho”.
Sobre o seu país, Abdou disse: “Senegal tem lugares muito bonitos, tem mar em uma cidade perto da minha. Lá tem muitas meninas bonitas e, aqui, também, as brasileiras também são muito bonitas”, disse, com um pouco de vergonha.
No Brasil: sonhos e a saudade do Senegal
“Difícil pra chegar aqui, muito difícil, saí do Senegal, parei na Espanha e, depois, no Equador. De lá pegamos um ônibus para o Acre, depois, São Paulo e Passo Fundo, para, depois, eu vir para Rio Grande”.
Toda essa saga levou cerca de 10 dias e mudou a vida de Abdou. Com os documentos temporários feitos ainda no Acre, o fotógrafo – agora sem câmera – enfrentou os perigos das estradas e veio parar em Rio Grande, no extremo sul do mapa.
Em Rio Grande, Abdou trabalha o dia todo na fábrica. No resto do tempo, ele passa no computador, conversando com a Nara e fazendo outras coisas. As bijuterias – muito comuns de serem vendidas por seus compatriotas nas ruas da cidade – nunca chegaram a ser comercializadas por ele. E, para quem tem curiosidade sobre a procedência dos adornos vendidos pelos africanos, segundo informações, as peças vêm da cidade de São Paulo, procedência comum de vários produtos comercializados em estabelecimentos tradicionais do Rio Grande.
Sobre diversão, o calmo Abdou disse não ter distração. “Eu não faço nada, fico em casa sempre, não gosto de sair de casa”, contou. Levando em consideração a música que era cantarolada pelo companheiro de Abdou, pensou-se que o senegalês também ouvia músicas para relaxar, mas não. “Eu não escuto essas músicas, eles sim [referindo-se ao colega], eu apenas ouço os cantos da religião”. Abdou é muçulmano, mas não tem conseguido frequentar a mesquita devido aos horários de trabalho. “Eu não consigo, porque eu trabalho na hora do culto”, lamenta. Porém, os preceitos da religião são seguidos pelo africano.
Em casa, Abdou divide seu tempo em conversar com os amigos, com a esposa, através da internet, e fazer vídeos românticos para enviar para Nara – quando a reprtagem foi à casa de Abdou, faltava cerca de uma semana para o Dia dos Namorados, e os vídeos para a amada já estavam prontos. “Sim, eu sou muito feliz aqui, não me arrependo de ter vindo, mas o mais difícil daqui é que tenho muita saudade dela [esposa Nara]”.
Abdou diz gostar muito da cidade. “Eu gosto daqui, me acolhem bem aqui e eu gosto de muitas coisas daqui. Aqui, não tem preconceito e, por isso, eu só espero ter um bom trabalho, ganhar mais e conseguir economizar”, conta um pouco de seu objetivo e acrescenta: “as pessoas são muito abertas aqui, não mais do que no Senegal, mas, quando tu é uma pessoa de outra cultura e de outra cor, tu pode ficar isolado. Mas, no Brasil, tu não fica isolado. Aqui, no Brasil, quando a gente pede ajuda, eles [brasileiros] param de fazer tudo que estiverem fazendo só pra ajudar você. Aqui, eu não passei dificuldade”, afirmou, parecendo estar muito agradecido.
Sobre os ganhos no Brasil, Abdou explica que parte do que ganha vai para a esposa e para a mãe no Senegal. Com a quantia que consegue economizar mensalmente, Abdou pretende retornar à sua cidade de origem. “Sim, eu vou voltar sim. Agora, eu não consego voltar, então é melhor esperar o documento permanente para poder voltar”, disse, referindo-se ao visto permanente que pretende conseguir.
O Senegal
A República do Senegal se localiza na África Ocidental, banhada pelo Oceano Atlântico a oeste, e conta com cerca de 13,5 milhões de habitantes, em uma área de 196.722 km² – tamanho semelhante ao estado do Paraná, porém, com 3.000 km² a menos e com 2 milhões de pessoas a mais. Apesar de apresentar um dos regimes econômicos e sociais mais estáveis da África Ocidental, o país ainda enfrenta muitos desafios na erradicação da pobreza e da desnutrição, principalmente no meio rural.
Grande parte de sua população sobrevive da agricultura e, de acordo com o Banco Mundial, quase a metade dela (46,7%) vive abaixo da linha de pobreza. Apesar dos esforços governamentais no tocante à nutrição e à segurança alimentar, que têm feito os níveis de desnutrição caírem ano a ano, a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) estima que um quarto do povo senegalês deva apresentar algum tipo de desnutrição.
A capital, Dakar, é uma das cidades mais populosas da África Ocidental e, mesmo ocupando apenas 0,28% do território nacional, abriga metade da população urbana do país. Dakar também concentra 25% da população nacional e 80% das atividades econômicas de todo o país.


*Com base nas informações dos sites http://www.gouv.sn/ e http://www.fao.org/home/en/

Na próxima edição, acompanhe a história de luta e humildade do senegalês Muhamed Danse Diop, que morou em Caxias do Sul, antes de escolher Rio Grande como sua segunda casa, e que sonha com a volta ao continente africano.
Por Esther Louro
esther@jornalagora.com.br
Fonte: http://www.jornalagora.com.br/site/content/noticias/detalhe.php?e=3&n=74344

sábado, 27 de junho de 2015

MULHERES DO MUNDO – QUEM SÃO AS IMIGRANTES EM CAXIAS do sul - rs

Muito tem se falado sobre os imigrantes. Especula-se sobre as razões, mudanças e consequências das recentes migrações. Estudos acerca do tema ganham espaço na mídia. Todos querem saber de onde vem, o que buscam, como irão viver os imigrantes. Entretanto, o artigo “os” da frase não abrange todos os imigrantes, independentemente do sexo, mas sim eles, os homens imigrantes. Pouco se fala sobre as mulheres, coadjuvantes nas migrações. Nas ruas, em meio a grupos de estrangeiros, elas são minoria. O assunto gera um questionamento: qual o papel das mulheres nesse cenário?
De acordo com coordenadora do Centro de Atendimento ao Migrante de Caxias do Sul, irmã Maria do Carmo dos Santos Gonçalves, atualmente há o registro de 77 mulheres imigrantes atendidas na cidade, número muito pequeno se comparado ao número de homens imigrantes atendidos no mesmo período. “Contudo, é importante destacar que a totalidade dos imigrantes atendidos pelo Centro não representa o universo geral de todos os imigrantes residentes em Caxias do Sul”, ressalta.
Diversos fatores explicam a discrepância entre o número de mulheres e homens imigrantes. Maria do Carmo afirma que, normalmente, primeiro imigram os homens, que depois de estabelecidos buscam trazer a família. “Como a responsabilidade do cuidado dos filhos recai sobre as mulheres, essas ficam para trás”, aponta. Entretanto, não se pode generalizar. Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) apontam para uma crescente “feminização” das migrações, principalmente nas situações vinculadas à migração forçada por guerras e conflitos. Nesse caso as mulheres e crianças costumam ser maioria.
Características das imigrações
A professora do Centro de Ciências Humanas da Universidade de Caxias do Sul (UCS) e coordenadora da pesquisa Migrações Internacionais no Sul do Brasil, Vania Herédia afirma que as migrações internacionais recentes possuem características laborais, por isso o homem migra com mais frequência. Para Vania, essa decisão tem a ver com a cultura de origem “Em alguns países africanos, onde vigora a poligamia, o homem migra e as mulheres permanecem no local de origem”. Maria do Carmo corrobora o pensamento. “Pode-se observar, por exemplo, que entre os imigrantes oriundos do Haiti – onde os casais são monogâmicos – há muito mais mulheres e crianças do que entre os imigrantes do Senegal”, observa.
Os registros do CAM apontam que a maioria das mulheres atendidas migrou com o marido ou logo após ele ter se estabelecido. Também há mulheres que migraram sozinhas e que deixaram filhos nos países de origem. De acordo com a coordenadora do Centro, o que se observa de modo geral é que o que prevalece no processo migratório é a dor do afastamento familiar.
Porém, nesse sentido sofrem tanto os homens como as mulheres. Boa parte dos imigrantes homens deixaram esposa e filhos no país de origem. “Os casais sofrem por ter deixado os filhos. Eu diria que há uma dor emocional que cresce pelo fato de ser muito difícil o processo de reunião familiar dos imigrantes no Brasil, principalmente para aqueles que não possuem ainda a permanência definitiva”, relata.
Apesar da dor do afastamento, uma vez estabelecidas na cidade, as imigrantes buscam uma colocação no mercado de trabalho, tanto para o próprio sustento quanto para a manutenção da família no país de origem. A grande maioria das imigrantes que estão em Caxias está empregada. “Não trabalhar não é uma opção”, diz Maria do Carmo, que afirma que algumas não estão trabalhando, pois têm filhos pequenos e não conseguiram vagas em creches ou alguém para cuidar das crianças.
No Brasil, muitas das imigrantes deparam-se com diferenças culturais, até mesmo em relação ao papel desempenhado pela mulher na sociedade. Para a socióloga Vania, a mulher brasileira, mesmo que ainda esteja lutando pela emancipação, é protagonista de sua história e tem mais oportunidades para experiências que a mulher africana ou a que vive no Caribe. “A sociedade brasileira oferece muitas oportunidades de mobilidade social à medida que existe a possibilidade de instrução pública para a maioria. As mulheres têm oportunidades de diversas escolhas, apesar de ter influências culturais dependendo do estrato social que se vincule”, afirma.
O perfil da mulher migrante não apresenta muitas variações. Em sua maioria são esposas e mães, que atravessam oceanos para acompanhar o marido. Algumas viajam com os filhos, outras deixam para trás família e amigos, tudo por uma aposta em um mundo novo.
Salut, je m’appelle…
Olhar bondoso, sotaque pesado, fala rápida, boa educação. Essa é Mariama, uma dentre as muitas mulheres que deixaram sua família e seu país em busca de uma vida melhor. Seu nome completo é Mariama – parecido com Mariana, como ela diz – Hyele Badji. Nascida no Senegal, a jovem de 26 anos é mãe de dois filhos. Mariama migrou há um ano e quatro meses para juntar-se o marido, há quatro anos na cidade. Na ponta da língua a senegalesa trouxe o português que aprendeu na escola. Na bagagem vieram alguns pertences e a saudade do filho mais velho, um menino de apenas três anos que ficou com a família.
No último Natal, Mariama e seu marido ganharam um presente: uma filha. Caxiense de nascimento, senegalesa de sangue, a pequena, agora com seis meses, é o motivo pelo qual a migrante não está trabalhando. A mãe afirma que cuidará da pequena até que complete um ano de idade. Seu marido, que trabalhava no Ceasa, há pouco encontra-se na mesma situação que a mulher.
A pequena família de Mariama mora em um apartamento na rua Marquês do Herval. Quando alugaram o lugar, receberam as chaves da imobiliária. Entretanto, o dono do imóvel, ao descobrir que tratavam-se de imigrante, mandou trocar todas as fechaduras. De acordo com a migrante, pequenas ações discriminatórias acontecem, mas não são maioria. “Não passo tanta dificuldade. Além do meu esposo também tenho uma amiga que me ajuda”, relata. A amiga em questão é uma brasileira, chamada Adriana.
Mariama está em Caxias há um ano e quatro meses.
Mariama está em Caxias há um ano e quatro meses.
Em meio ao preconceito esporádico, a amiga traz conforto entre os milhares de desconhecidos. Muitos deles, segundo a migrante, incapazes de compreender a dificuldade em partir deixando para trás um mundo inteiro. “Estava buscando uma vida melhor. Muitos deixaram o trabalho, a família lá. No Senegal, nos passam uma imagem positiva do Brasil e pagamos muito caro para vir para cá”, conta.
Quando chegou à cidade, Mariama teve que se acostumar com os costumes. Além do frio que afirma sentir, outro ponto com o qual não estava habituada era a individualidade do caxiense. “Lá vivíamos em comunidade, as pessoas eram solidárias. Aqui tenho dificuldade para encontrar ajuda para cuidar da minha filha. No Senegal, todos se ajudam”, relembra. As pequenas diferenças fazem aumentar a saudade que sente pelo filho pequeno que lá ficou.
Para apaziguar a tristeza, a tecnologia entra em cena. Skype, Whatsapp, tudo que a fizer enxergar o rosto e ouvir a voz do menino é bem-vindo. O desejo de trazê-lo existe. Porém, a família está enfrentando dificuldades para retirar o passaporte da criança.
Além das amizades, a religião também conforta. Mesmo que aqui não haja muitos seguidores do islamismo, os senegaleses fazem questão de honrá-lo, ainda que de forma improvisada. Mariama descreve o Islam como uma religião nobre. “Não importa para onde vamos ou onde estamos, a religião é algo que trazemos dentro de nós”, afirma.
De acordo com a migrante, uma mulher no islamismo não pode usar roupas normais – como as que estava usando e costuma usar aqui –, deve cobrir o corpo, deixando apenas os olhos à mostra e não pode dar a mão à nenhum homem além do marido. Em Caxias, os senegaleses alugaram uma casa, onde encontram-se todos os sábados para reafirmar sua fé em Alá.
O sonho de Mariama não é voltar para o Senegal, mas sim ir para o Canadá continuar seus estudos. No país de origem, a jovem estudou durante três anos para cursar enfermagem. Mesmo longe de casa e, momentaneamente, da possibilidade de estudar, a vontade de construir um futuro melhor permanece.
Mariama é apenas uma das tantas mulheres que partiu. Aqui, aumentou sua família. Aqui, continua a escrever sua história, que promete romper diversas barreiras.
Mulheresmigrantes
Texto e imagens: Mayara Zanella.
Fonte: http://novosimigrantesemcaxias.com/2015/06/23/mulheres-do-mundo-quem-sao-as-imigrantes-em-caxias/

quinta-feira, 25 de junho de 2015

Audiência discute situação de imigrantes haitianos e africanos em SC

Audiência foi promovida pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia. FOTO: Miriam Zomer/Agência AL
Falta de documentação e dificuldades com o idioma foram algumas das dificuldades apontadas pelos participantes da audiência pública que discutiu a situação dos imigrantes de países africanos e americanos, em especial do Haiti, que vivem em Santa Catarina, realizada na noite desta quarta-feira (24), na Assembleia Legislativa. O encontro foi promovido pela Comissão dos Direitos Humanos do Parlamento catarinense. Entre as conclusões da audiência, a necessidade de políticas públicas que atendam os imigrantes, a revisão da Lei do Estrangeiro e o melhor planejamento das ações voltadas à recepção dos imigrantes por parte do poder público.
“Nosso objetivo com essa audiência é apontar caminhos para garantir que os imigrantes tenham acesso a direitos básicos, como trabalho, moradia, saúde, educação, e que também não sejam vítimas de discriminação que alguns setores querem passar”, explicou o presidente da comissão e proponente da audiência, deputado Dirceu Dresch (PT).
Grupos e associações de imigrantes do Haiti e de países africanos, como o Senegal, acompanharam a audiência. Entre os principais pedidos, a disponibilização de documentação para que os imigrantes possam regularizar sua situação no Brasil, a promoção da cultura haitiana e a convalidação de diplomas estrangeiros. “O Brasil é um país acolhedor e tem várias possibilidades para um estrangeiro. Nosso objetivo é contribuir com o progresso dessa grande pátria, com respeito e paz”, afirmou o presidente da Associação de Haitianos de Florianópolis (Kay Pa Nou), Chery Clarens.
A antropóloga Tanajara da Silva, da Pastoral do Imigrante, apresentou os resultados de um estudo sobre os imigrantes em Santa Catarina. Só neste ano, no estado, foram emitidas mais de 2 mil carteiras de trabalho para haitianos. “Nós temos necessidade inadiável de criar um conselho estadual de apoio ao imigrante, de inseri-los no ambiente escolar, de convalidar seus diplomas”, afirmou Tanajara, que apontou várias outras ações, entre elas a revisão da Lei da Imigração, elaborada ainda durante o regime militar.
A representante da Cáritas Brasileira, Fabiana Gonçalves, também defendeu mudanças na legislação sobre os estrangeiros. “Foi uma lei que estava preocupada com a segurança nacional, e não com o bem-estar das pessoas que vêm pra cá em busca de melhores oportunidades, que deixam seus países de origem não porque querem, mas porque precisam sobreviver”, destacou.
Mais imigrantes
A secretária de Estado da Assistência Social, Trabalho e Habitação, Angela Albino, revelou que mais imigrantes devem chegar ao estado nos próximos dias. “São 43 ônibus que estão vindo do Acre”, comentou. “Boa parte deles já chega com referência familiar ou de amigos ou com oportunidade de emprego, mas alguns não têm onde ficar”, completou.
Angela afirmou que a secretaria vai receber os haitianos que chegarem a Florianópolis no ginásio de esportes Capoeirão, a exemplo do que ocorreu no final de maio, quando os primeiros imigrantes do país caribenho chegaram ao estado. A secretária também defendeu a revisão da Lei do Imigrante e a criação de uma política de acolhimento, que atue de forma preventiva.
A deputada Luciane Carminatti (PT) também defendeu a criação de políticas de acolhimento aos imigrantes. “Chama a atenção a dificuldade de humanizar essa relação, de acolhimento, de respeito, de se entender que são seres humanos, independente da cor da pele e da condição social, que estão em busca de melhores condições de vida”, disse.

Luciane citou como exemplo o projeto desenvolvido pela Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) em Chapecó que oferece vagas em cursos superiores para os haitianos que trabalham na região. A professora Sandra Farias Bordignon, responsável pelo projeto, afirmou que o objetivo é dar visibilidade ao tema e inserir os haitianos no meio acadêmico. “O idioma é a nossa maior barreira”, considerou.
Marcelo Espinoza
AGÊNCIA AL

Fonte: http://agenciaal.alesc.sc.gov.br/index.php/noticia_single/audiencia-discute-situacaeo-de-imigrantes-haitianos-e-africanos-em-sc

quarta-feira, 24 de junho de 2015

Novos grupos de imigrantes são esperados para o sul do Brasil

Abrigo no Acre está com 400 pessoas, quando capacidade é de 110

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Novos grupos de imigrantes são esperados para o sul do Brasil Roni Rigon/Agencia RBS
Imigrantes continuam chegando diariamente no país e em Caxias do SulFoto: Roni Rigon / Agencia RBS
Diego Mandarino/ Rádio Gaúcha Serra
Mais imigrantes que chegaram ao Brasil pelo Acre poderão se deslocar ao sul do Brasil. Conforme o coordenador do abrigo de acolhimento mantido pelo governo estadual na capital Rio Branco, Antonio Crispim, o espaço está sendo ocupado por 400 pessoas e a capacidade é de 110. Quarenta pessoas chegam ao local por dia, ou 1.200 pessoas por mês, vindo de ônibus pela cidade de Assis Brasil, na fronteira com Peru e Bolívia: 

— Há pouco, um ônibus com 44 pessoas estava chegando — informa. 

Grande parte dos imigrantes está dormindo no chão. Segundo Crispim, um novo encaminhamento está sendo feito pelo estado do Acre junto ao Governo Federal para financiar o deslocamento dos imigrantes ao sul do Brasil. Eles são haitianos, dominicanos, senegaleses, ganeses e de Bangladesh. Há uma criança filha de haitianos que nasceu no Equador, durante a viagem. As tratativas do governo acriano ocorrem junto ao Ministério da Justiça.

A maioria quer se deslocar a São Paulo. Outros perguntam onde há emprego. Uma parte passa apenas uma noite no abrigo e no dia seguinte tira o CPF nos Correios, compra passagem e se desloca para outra cidade do país. Outros, no entanto, que não têm dinheiro, ficam até dois meses, afirma o coordenador. Crispim explica que um questionário será feito com os imigrantes que estão no abrigo para que eles informem se há amigos ou conhecidos que já estão no país afim de buscar o melhor destino — isso até 12 horas antes da viagem, para que o poder público possa intermediar a compra de passagens via recursos federais.

Mas o governo do Acre ainda não sabe quando esse convênio vai se concretizar, pois depende de resposta formal do Governo. Nesse caso, haverá articulação com estados e municípios para organizar a recepção dos grupos, garante o coordenador.

A irmã Maria do Carmo dos Santos Gonçalves, do Centro de Atendimento ao Migrante (CAM) de Caxias do Sul, aponta outra situação, confirmada por Crispim: muitos imigrantes compram passagens de ônibus com recursos próprios, escolhendo destinos onde terão trabalho ou uma rede de parentes ou amigos. Como a comunidade de imigrantes já é significativa em Caxias do Sul, e essa rede pode acolher novas pessoas, a procura também é contínua e novos imigrantes chegam diariamente. 

Com a situação econômica e menos vagas de emprego na cidade serrana, os novos imigrantes têm mais dificuldade e passam mais tempo sem emprego. No início deste mês, quase 200 imigrantes buscavam emprego na cidade.

Mas Maria do Carmo diz que, apesar da demora, não há falta de trabalho. 

— Semana passada duas empresas nos procuraram buscando mão de obra migrante.

Segundo a irmã, trata-se de empresas de cidades menores da Serra onde já não há mais mão de obra. Cerca de 3 mil senegaleses moram em Caxias do Sul e outros grupos significativos vieram à cidade principalmente do Haiti e de Gana.
Fonte: http://pioneiro.clicrbs.com.br/rs/geral/cidades/noticia/2015/06/novos-grupos-de-imigrantes-sao-esperados-para-o-sul-do-brasil-4788062.html

terça-feira, 16 de junho de 2015

Paraná oferece cursos técnicos e de Língua Portuguesa para haitianos

Publicado em 15/06/2015 12:10

Paraná oferece cursos técnicos e de Língua Portuguesa para haitianos. 12-06-15. Foto: Hedeson Alves



O Governo do Paraná, através da Secretaria de Estado da Educação, oferece desde o ano passado uma nova oportunidade para imigrantes haitianos e africanos que vieram para o Estado em busca de uma vida nova. O curso de Língua Portuguesa para Imigrantes é oferecido gratuitamente na Vila da Cidadania, em Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba. 

Além do curso de idioma, a Secretaria da Educação oferta gratuitamente cursos técnicos de nível médio, que possibilitam uma chance de recomeço.

O curso de Língua Portuguesa para Imigrantes, que funciona de segunda a quinta-feira, é dividido em quatro módulos e tem duração de um ano. Após a conclusão, os participantes recebem um certificado do Instituto Federal do Paraná (IFPR) de domínio básico em Língua Portuguesa. O curso é ministrado por professores voluntários em Português e, também, em Francês, quando os alunos têm maior dificuldade.

Essa é a segunda turma do curso e conta com 47 alunos – 45 do Haiti, um da República Democrática do Congo e um do Senegal. Os alunos chegam à Vila da Cidadania por volta das 17h, jantam e aproveitam o intervalo para descansar e estudar antes do início das aulas, às 20h. Às 22h, um ônibus cedido pela Secretaria da Educação os leva até pontos próximos à suas casas.

RECOMEÇO – A haitiana Michena Beuti veio para o Paraná em abril deste ano com o irmão e um primo. Foram quatro dias de viagem de ônibus de Rio Branco, no Acre, até chegar a Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba. “Foram muitos dias de viagem para chegar até aqui”, contou.

Depois de um mês de curso, Michena já consegue conversar em português e hoje se prepara para uma entrevista de emprego em uma rede de restaurantes. “Graças ao curso eu consigo me comunicar em Português e me sinto mais preparada”, disse Michena, que é formada em Hotelaria e Turismo.

Bernardo Rikenson também está no Estado há dois meses. Ele contou que veio para o Paraná para estudar e que o curso está sendo fundamental para aprender o idioma. “Eu vim para o Brasil para estudar e precisava conhecer o idioma. Não acho difícil, apenas um pouco complicado”, disse Bernardo que já têm fluência em francês e inglês e domina o espanhol. “Quero estudar mecânica industrial e continuar no Brasil”, confessou.

A procura dos imigrantes por cursos técnicos de nível médio também é grande. Entre os mais buscados estão os de Informática e Administração. “É uma oportunidade que a Secretaria da Educação oferece para que aqueles que desejam uma formação profissional para ingressar no mercado formal de trabalho”, disse a chefe do Departamento de Educação e Trabalho, Margaret Sbaraini. No Paraná são mais de 300 imigrantes haitianos matriculados em escolas da rede estadual de ensino. 
Fonte:http://www.aen.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=84537&tit=Parana-oferece-cursos-tecnicos-e-de-Lingua-Portuguesa-para-haitianos

segunda-feira, 15 de junho de 2015


O haitiano que acolheu mais de 1,4 mil migrantes

Padre Agler Cherizier coordena a Pastoral do Migrante, que desde 2010 auxilia estrangeiros que chegam à região de Curitiba

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Texto publicado na edição impressa de 15 de junho de 20
O padre haitiano Agler Cherizier, de 33 anos, desembarcou em Curitiba em março do ano passado – três anos e dois meses depois do terremoto que devastou seu país natal e matou mais de 250 mil pessoas. Não veio para recomeçar a vida – como já fizeram milhares de migrantes do Haiti – mas, justamente, para amparar estrangeiros que se veem obrigados a deixar suas terras, fugindo da fome ou de perseguições políticas ou religiosas. À frente da Pastoral do Migrante, vinculada à Igreja Católica, ele e sua equipe acolheram mais de 1,4 mil pessoas em um ano, na região de Curitiba.
Quando chegou à Pastoral, padre Agler encontrou uma estrutura que já carregava uma década de experiência em receber e orientar os migrantes. Na sede, um salão ao lado da igreja de Santa Felicidade, dezenas e dezenas de forasteiros são atendidos todos os dias. Muitos chegam com a roupa do corpo, sem falar português, sem conhecidos e sem ter para onde ir. Histórias que se repetem e que padre Agler conhece de cor. Vê a dor de seu povo ali, naqueles retirantes.
“São pessoas que têm sonho de trabalhar, de estudar, de viver de forma digna, mas não têm uma estrutura que possibilite. São pessoas que migraram por uma questão de sonho e sobrevivência”, disse. “Para a gente também é difícil, porque quem acolhe também sofre”, revelou.
A Pastoral cadastra os migrantes, providencia documentos e tenta encaminhá-los ao mercado de trabalho. A equipe mantém contato com 450 empresas de Curitiba e região metropolitana, que já empregaram ou empregam os estrangeiros. Padre Agler, no entanto, destaca que “o mar não está para peixe”. Por causa da crise, empresas têm evitado contratar – não só estrangeiros. Quando há vagas, têm sido na região metropolitana ou no interior. Se os empregos demoram, nunca faltam palavras de acolhimento do padre haitiano ou da assistente social, Edesia de Souza Sato, uma mulher incansável que trata os migrantes com um ar maternal.
“Muitos estão decepcionados, querendo voltar [ao país de origem]. A maioria fez dívidas ou vendeu o que tinha para vir”, mencionou o padre.
Todo esse serviço é prestado pela Pastoral por meios próprios. A entidade não recebe um centavo do poder público. Enquanto o Paraná ainda esboça uma estrutura de acolhimento, Padre Agler e sua equipe estão escolados. Dão de ombros à falta de auxílio. “Outro dia, a prefeitura ligou perguntando se não conseguíamos trabalho para um grupo de haitianos que haviam procurado ajuda lá. Ora, eles deveriam ser referência. Mas não há preocupação com isso por parte do poder público”, disse.

Preconceito

Nesta semana, a Pastoral do Migrante promove a 30.ª Semana Nacional do Migrante, com programação específica, como debates, missas e celebrações, em cada paróquia de Curitiba. O objetivo é tentar minimizar o preconceito. “O migrante não quer ganhar o pão. Quer conquistá-lo com a luz do seu suor. Além disso, o migrante não vem só com problemas. Vem com sua riqueza cultural, que contribuem com a comunidade”, disse o padre.
Fonte: http://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/o-haitiano-que-acolheu-mais-de-14-mil-migrantes-d0dbfgg968k3mtzc0wd3rqj0l